Relatório de Inspeção realizada no Departamento
Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) apontara indícios de sobrepreço em
contrato destinado à construção da infraestrutura básica de irrigação do
Projeto Tabuleiro de Russas - 2ª Etapa, em especial no item “tubos de ferro
fundido”. Ao analisar as oitivas regimentais, o auditor instrutor contestou a
metodologia utilizada pela equipe de fiscalização para apuração do sobrepreço,
destacando que “embora a utilização das
notas fiscais para verificação da compatibilidade dos preços contratados com
aqueles praticados pelo mercado seja juridicamente possível, não se afigura a
melhor solução, no presente caso concreto, uma vez que tal metodologia ‘somente
se mostra possível quando a diferença entre os preços do orçamento e aqueles
efetivamente incorridos são irrazoáveis, desproporcionais ou inaceitáveis’ ”.
Nesse sentido, concluiu o auditor pela inexistência de sobrepreço, uma vez que
a diferença a maior observada nos preços contratuais seria de apenas 1,28% do
preço total do ajuste na data base de abril/2008, obtida em uma amostra de
apenas 49,24% do contrato. O diretor e o titular da unidade técnica, porém,
divergiram desse entendimento. Ressaltou o diretor que as diferenças observadas
nos preços contratuais a partir do exame das notas fiscais (situadas entre 26%
e 71%, com uma variação média ponderada de 53%), não estariam “numa faixa de variabilidade aceitável de
mercado, não podendo, portanto, ser excluída [a amostra formada por tubos
de ferro fundido] da análise total do
sobrepreço realizada”. O titular da unidade técnica acrescentou que "não havia, nos sistemas de referência
oficiais e subsidiários, paradigmas de preço na data-base de abril/2008”, e
que a empresa que emitira as notas fiscais seria “o único produtor e fornecedor de tubos de ferro fundido no Brasil,
operando em um mercado monopolista, o que levou à descontinuidade da divulgação
da referência de mercado pelo IBGE no âmbito do Sinapi”. O relator, endossando as conclusões do diretor e do titular da unidade técnica, ressaltou que, conforme os
Acórdãos 157/2009-Plenário e 993/2009-Plenário, “o uso das notas fiscais para apuração de
sobrepreço em contratos de obras públicas se mostra possível desde que haja
‘incoerências grosseiras nos preços dos insumos, e nas hipóteses em que tais
inconsistências sejam materialmente relevantes e capazes de propiciar um
enriquecimento ilícito do contratado’ ” . Sobre o caso em exame, destacou o
relator que, para formar o preço de referência, a unidade técnica utilizara “o custo direto de aquisição da contratada
junto ao fabricante (...) acrescido dos seguintes custos: Imposto sobre
Produtos Industrializados - IPI de 5%, Diferença de Alíquota do Imposto sobre a
Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS de 3% e frete de 20%”, fazendo
ainda incidir, sobre o custo total obtido, o percentual de 35,22%, referente ao
BDI do contrato. Diante do exposto, concluiu o relator que o preço de
referência obtido “levou em conta todos
os custos envolvidos na cadeia de fornecimento dos insumos, não havendo,
portanto, nenhum reparo a fazer na metodologia usada pela unidade técnica”.
Além disso, destacou o relator o conservadorismo da análise realizada pela
unidade técnica, uma vez que adotara o BDI contratual de 35,22 %, “percentual bem acima do atualmente aceito
pelo Tribunal como adequado”, utilizando ainda notas fiscais “emitidas entre janeiro e março de 2009 como
base para a obtenção do preço de referência de abril/2008, quase um ano antes”.
Por fim, ao rebater novos argumentos de defesa apresentados pela contratada, a qual invocara precedentes
do Tribunal que afastaram o uso dos custos incorridos pelo contratado como base
para a obtenção do preço de mercado (Acórdãos 910/2014-Plenário e 2784/2012-Plenário), o relator
registrou que “não se nega que esse é o entendimento correto à luz do
regime jurídico dos contratos administrativos e do próprio sistema econômico do
país que prega a liberdade de iniciativa e a busca do lucro”. Contudo, ressalvou,
“em situações extremas como a que ora se
enfrenta, em que não existem preços nos sistemas referenciais e o insumo
analisado foi adquirido em um mercado monopolístico, julgo que o valor obtido
das notas fiscais, acrescido de custos indiretos e BDI acima do atualmente
aceito pelo TCU, constitui um parâmetro seguro do valor de mercado do bem.
Tomando por base a ideia de abuso de direito e os princípios da boa-fé
contratual e do não enriquecimento sem causa, entendo que os preços praticados
pela contratada excedem o limite do razoável, não podendo ser considerados
compatíveis com os de mercado”. Caracterizado o dano ao erário, o Tribunal,
pelos motivos expostos pelo relator, decidiu converter os autos em tomada de
contas especial, determinando à unidade técnica, dentre outras medidas, que “envide esforços para ampliar a amostra de itens
do Contrato (...) a ser usada para a análise da ocorrência de sobrepreço,
averiguando, inclusive, as pesquisas de preço eventualmente realizadas pelo
Dnocs com vistas ao exame da economicidade do ajuste antes do início da
execução contratual”. Acórdão 1992/2015-Plenário, TC 028.869/2011-7, relator Ministro Benjamin Zymler, 12.8.2015.
Entusiasta da Administração Pública, Petrônio Gonçalves, Economista pós-graduado, Militar aposentado, Pregoeiro com mais de 20 anos na área, facilitador da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) e do Centro de Formação do Servidor Público do Est. de PE (CEFOSPE), fomenta neste blog as discussões sobre a matéria. Com súmulas, decisões e acórdãos do TCU, e textos de juristas, (© Copyright 10/11/12/13/14/15/16/17/18/19/20 Tribunal de Contas da União; dos Juristas/Autores/p. Editor).
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sexta-feira, 27 de novembro de 2015
Para apuração de superfaturamento em contratos de obras públicas, admite-se a utilização de valores obtidos em notas fiscais de fornecedores das contratadas como parâmetro de mercado (acrescido dos custos indiretos e do BDI), quando não existirem preços registrados nos sistemas referenciais e o insumo provier de um mercado monopolístico.
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