É irregular a contratação por entidade
privada, com recursos de convênio ou instrumento congênere, de empresa cujos
sócios tenham relação de parentesco com os seus dirigentes, pois, embora possa
realizar procedimento mais simplificado de licitação, a entidade privada está
obrigada a preservar a impessoalidade e a moralidade administrativa na seleção
de suas propostas e nas respectivas contratações.
A Primeira Câmara analisou tomada de
contas especial instaurada pelo Ministério do Esporte contra uma entidade
fundacional privada e seu dirigente em razão da não-comprovação da regular
aplicação de recursos captados com base no incentivo fiscal previsto na Lei
11.438/2006 e transferidos por meio de termo de compromisso. O objeto do ajuste
era a realização de torneios de futebol para crianças e adolescentes da cidade
de Poços de Caldas/MG e regiões vizinhas. A unidade técnica demonstrou que, à
exceção dos gastos com hospedagem, todos os pagamentos de despesas tiveram como
destinatárias empresas cujos sócios tinham vínculo de parentesco com o
presidente da entidade, ou que pertenciam ao próprio responsável, infringindo
frontalmente os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa,
inscritos no caput do artigo 37 da Constituição Federal, c/c o art. 9, III e §
3º, da Lei 8.666/1993, além dos artigos 19, 22, inciso III, e 23, da Portaria
ME 166/2008 e de cláusulas do termo de compromisso firmado. Ao examinar o caso,
o relator confirmou que houve direcionamento para a contratação de serviços
junto a “empresas de interesse e
titularidade do dirigente daquela entidade fundacional ou cujos sócios tinham
vínculo de parentesco com o responsável, em franca violação aos princípios da
impessoalidade e da moralidade”. E asseverou ser “óbvio que, nesse contexto, qualquer cotação de preços para os serviços
avençados, conforme exige o artigo 19 da Portaria ME 166/2008, seria uma farsa,
pois as contratações mencionadas privilegiaram empresas de interesse” do
responsável. Em sustentação ao seu argumento, o relator considerou que se
aplicava ao termo de compromisso examinado, por força do art. 116 da Lei
8.666/193, as disposições do art. 9º, caput e § 3º dessa lei, que vedam a
participação direta ou indireta, em licitações, de pessoas ou empresas que
tenham qualquer liame de natureza técnica, comercial, econômica ou trabalhista
com o ente promotor do certame público, deixando claro que as “hipóteses de vedação referidas nesse
dispositivo legal não são numerus clausus, isto é, não se restringem à
participação de autor de projeto na execução de obra ou na prestação de
serviços, sob pena de ferir a mens legis ou a finalidade da norma que visa
preservar a moralidade administrativa e a isonomia entre licitantes. Nessa
vereda, também são abrangidas pela interdição legal outras situações em que
haja vínculo pessoal ou societário entre o agente público responsável pela
realização do torneio licitatório e o licitante, o que geraria potencial
conflito de interesse e direcionamento da licitação”. Deste modo, conclui
que, “embora a fundação deva realizar
procedimento mais simplificado de licitação por meio de cotação prévia de
preços para fornecimento de bens e serviços, também está obrigado a preservar a
impessoalidade e a moralidade administrativa na seleção das propostas e nas
respectivas contratações, sem que haja privilégios, direcionamento do certame e
quebra da isonomia”. Seguindo o voto do relator, a Primeira Câmara rejeitou
as alegações de defesa apresentadas pelo responsável e pela entidade privada,
julgando suas contas irregulares, condenando-os solidariamente em débito e
aplicando-lhes a multa do art. 57 da Lei 8.443/1992.
Acórdão
3023/2019 Primeira Câmara, Tomada de Contas Especial, Relator Ministro Walton
Alencar Rodrigues.
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