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terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Os órgãos e entidades da Administração Pública Federal podem aceitar apólice de seguro - apresentada por empresa vencedora de certame licitatório para garantir o fiel cumprimento das obrigações assumidas no contrato - que contenha cláusula que exclua de cobertura prejuízos e demais penalidades causados ou relacionados a atos ou fatos violadores de normas de anticorrupção que tenham sido provocados pelo segurado ou seu representante, seja isoladamente, seja em concurso com o tomador ou seu representante. Por outro lado, devem recusar apólice de seguro que contenha cláusula que exclua de cobertura prejuízos e demais penalidades causados ou relacionados a atos ou fatos violadores de normas de anticorrupção que tenham sido provocados exclusivamente pelo tomador ou seu representante, sem o concurso do segurado ou seu representante.



       Em consulta endereçada ao TCU, o Ministro Presidente do TST formulou o seguinte questionamento: “Os órgãos e entidades da Administração Pública Federal devem aceitar ou recusar apólice de seguro - apresentada por empresa vencedora de certame licitatório para garantir o fiel cumprimento das obrigações assumidas no contrato - que contenha cláusula que exclua de cobertura prejuízos e demais penalidades causados ou relacionados a atos ou fatos violadores de normas de anticorrupção?” Em termos práticos, questionava-se a legalidade da inclusão, pela seguradora, de cláusula na apólice do seguro afastando a cobertura de prejuízos decorrentes de atos ou fatos violadores das normas anticorrupção, perpetrados pelo segurado (Administração Pública contratante), tomador (empresa contratada) ou controladas, controladoras e coligadas, seus respectivos sócios/acionistas, representantes, titulares ou funcionários. Em seu voto, o relator destacou, preliminarmente, que a cláusula atualmente inserida pelas seguradoras nas apólices, pela qual excluem da cobertura prejuízos e demais penalidades causados ou relacionados a atos ou fatos violadores de normas de anticorrupção, sejam eles praticados pelo segurado ou pelo tomador e respectivos representantes, busca amparo no art. 762 do Código Civil, segundo o qual “Nulo será o contrato para garantia de risco proveniente de ato doloso do segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de outro”. O relator ponderou que o Código Civil não trata do seguro-garantia a que alude o art. 56 da Lei 8666/1993, o qual busca “proteger a Administração Pública contratante do próprio contratado, caso venha a inadimplir suas obrigações”. Nesse contexto, o seguro-garantia “não é um contrato de seguro tradicional e tem algumas características também da fiança onerosa. No entanto, não guarda identidade perfeita com nenhum desses dois institutos. Não é sem razão que sua disciplina se dá por entidade especializada no assunto, que é a Susep”. Segundo o relator, a aplicação do sobredito art. 762 aos contratos de seguro-garantia não pode ocorrer sem considerar as peculiaridades desse tipo de contrato, haja vista que “citado dispositivo do Código Civil busca evitar que o contratante do seguro se beneficie de atos dolosos que busquem fraudar a essência desses contratos, ou seja, inspira-se na boa-fé objetiva e no princípio de que ninguém pode se beneficiar da própria torpeza”. O relator concluiu que admitir a continuidade da atual prática das seguradoras de inserir cláusula limitadora de suas responsabilidades no caso de ato de corrupção tanto do tomador quanto do segurado seria tolerar o elevado risco de ineficácia ampla do seguro-garantia, tendo em vista que, conforme apontado pela Susep, “as cláusulas inseridas pelas seguradoras, muitas vezes, apresentam textos genéricos e extremamente abrangentes com relação às situações, atos e pessoas que podem gerar a não cobertura”. De outro tanto, impor à seguradora o dever de cobrir os prejuízos decorrentes de atos de corrupção para os quais a própria Administração Pública concorreu seria permitir o benefício da própria torpeza de quem é o principal beneficiário do seguro-garantia, além de elevar os custos desse tipo de contratação a patamares desconhecidos, mas que, ao fim, teriam de ser suportados pelos cofres públicos. Assim, nos termos propostos pelo relator, o Plenário decidiu responder ao consulente que: I) “os órgãos e entidades da Administração Pública Federal podem aceitar apólice de seguro - apresentada por empresa vencedora de certame licitatório para garantir o fiel cumprimento das obrigações assumidas no contrato - que contenha cláusula que exclua de cobertura prejuízos e demais penalidades causados ou relacionados a atos ou fatos violadores de normas de anticorrupção que tenham sido provocados pelo segurado ou seu representante, seja isoladamente, seja em concurso com o tomador ou seu representante”; e II) “por outro lado, os órgãos e entidades da Administração Pública Federal devem recusar apólice de seguro - apresentada por empresa vencedora de certame licitatório para garantir o fiel cumprimento das obrigações assumidas no contrato - que contenha cláusula que exclua de cobertura prejuízos e demais penalidades causados ou relacionados a atos ou fatos violadores de normas de anticorrupção que tenham sido provocados exclusivamente pelo tomador ou seu representante, sem o concurso do segurado ou seu representante”.
Acórdão 1216/2019 Plenário, Consulta, Relator Ministro Raimundo Carreiro.

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