O uso de demonstrações financeiras
inidôneas com a finalidade de demonstrar qualificação econômico-financeira
justifica a declaração de inidoneidade da empresa responsável para participar
de licitações no âmbito da Administração Pública Federal (art. 46 da Lei
8.443/1992).
Representação
formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades na Superintendência Estadual
de Compras e Licitações (SUPEL) do Governo do Estado de Rondônia, relacionadas
à incapacidade econômico-financeira de empresas vencedoras de concorrências
públicas destinadas a pavimentação asfáltica no município de Rolim de Moura/RO,
com recursos de convênios. Entre as irregularidades suscitadas, mereceu
destaque o fato de a empresa vencedora das Concorrências 20, 21, 22, 23, 24, 26
e 27/18/CPLO/SUPEL/RO haver apresentado documentação com balanços orçamentários
inidôneos, em afronta ao art. 31, inciso I, da Lei 8.666/1993, e ao art. 176, caput, incisos I e III, c/c o § 1º, da
Lei 6.404/1976. Em especial, foi constatado que, no ano de 2013, havia uma
diferença no valor de R$ 1.006.660,29 entre a receita auferida pela empresa
informada pelos entes federativos, no valor de R$ 2.750.529,77, e o declarado na
Demonstração de Resultado do Exercício (DRE) daquele ano, no valor de
R$1.743.869,48, e, no ano de 2014, uma nova diferença no valor de R$ 647.465,03
entre a receita informada pelos entes federativos e a apurada nos portais de
transparência, no valor de R$ 4.129.501,83, e a declarada na DRE, no valor de
R$ 3.482.036,80. Em sua defesa, a empresa alegou, em suma, que “a divergência em relação aos valores do
faturamento foi oriunda de equívocos, e não de conduta fraudulenta para obter
vantagens em licitações públicas, bem como que já teria efetuado as
retificações devidas”. Exame da unidade técnica demonstrou que, nos
documentos anexados, não havia nenhuma declaração retificadora, mas apenas
requerimentos encaminhados à Junta Comercial do Estado de Rondônia, os quais
não comprovavam se, de fato, teria havido retificação. No que concerne aos
reflexos da prática irregular nas referidas concorrências, a unidade técnica
assinalou: “A Lei 6.404/1976, art. 176,
caput, inciso I e III c/c §1º, prevê expressamente que as demonstrações
financeiras, entre elas o balanço patrimonial e a demonstração do resultado do
exercício, serão publicadas com os valores correspondentes das demonstrações do
exercício anterior e que as demonstrações financeiras deverão exprimir com clareza
a situação do patrimônio da empresa e as mutações ocorridas no exercício. Isto
significa que, em razão de haver um encadeamento lógico e contábil entre os
balanços patrimoniais de um ano e o seu seguinte, a informação errônea contida
em um balanço patrimonial terá a característica de projetar erros sucessivos em
todos os balanços patrimoniais seguintes ao do ano em que houver o erro,
somente cessando essa cadeia de eventos se for retificada e corrigida a
informação errônea. Além disso, a declaração na DRE referente ao exercício de
2014, no valor de R$ 3.482.036,80, manteve a empresa na situação de EPP, já se
tivesse declarado a quantia recebida de recursos federais naquele ano, no valor
de R$ 4.129.501,83, a empresa deixaria de ser enquadrada como EPP e não poderia
usufruir de um regime tributário mais benéfico. Assim, a empresa, ao não
contabilizar todas as receitas oriundas da Administração Pública no ano de
2014, cometeu fraudes tributária e contábil”. Em seu voto, anuindo ao
entendimento esposado pela unidade instrutiva, o relator ressaltou que a grave
irregularidade relacionada à apresentação de documentação para habilitação com
balanços orçamentários inidôneos “justifica
a declaração de inidoneidade da empresa para participar de licitação na
administração pública federal, com fulcro no art. 46 da Lei 8.443/1992”.
Quanto à dosimetria da pena, o relator arbitrou em dois anos a sanção da
empresa, levando em conta que: “o ato
irregular de não contabilizar todas as receitas nos exercícios de 2013 e 2014
contaminou os demonstrativos contábeis desses anos e dos subsequentes”, não
havia notícia de retificação dos dados, “a
não contabilização permitiu que a empresa usufruísse irregularmente da condição
de Empresa de Pequeno Porte (EPP), ao menos durante o exercício de 2014”,
e, por fim, “a omissão não permite aferir
a real situação econômico-financeira da empresa para participar de licitação e
honrar os compromissos daí advindos”. Assim, nos termos da proposta do
relator, o Plenário decidiu determinar ao Governo do Estado de Rondônia a
anulação do “ato administrativo que
habilitou a empresa nas Concorrências 20, 21, 22, 23, 24, 26 e
27/18/CPLO/SUPEL/RO, pelo fato de ter apresentado documentação para habilitação
com balanços orçamentários inidôneos”. O Pleno decidiu também “declarar a inidoneidade da empresa para
participar, por 2 (dois) anos, de licitação na administração pública federal”,
além de recomendar à Superintendência Estadual de Compras e Licitações do
Governo do Estado de Rondônia que, “havendo
dúvidas sobre o enquadramento de licitante na condição de microempresa ou de
empresa de pequeno porte, segundo os parâmetros estabelecidos no art. 3º da Lei
Complementar 123/2006, além de realizar as pesquisas pertinentes nos sistemas
de pagamento da administração pública federal, solicite à licitante a
apresentação dos documentos contábeis aptos a demonstrar a correção e a
veracidade de sua declaração de qualificação como microempresa ou empresa de
pequeno porte, para fins de usufruto dos benefícios da referida lei”.
Acórdão
2445/2019 Plenário, Representação, Relator Ministra Ana Arraes.
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